A Universidade Nova e a Educação a Distância

José Matias-Pereira*

O debate sobre o papel da educação em uma sociedade de caráter acentuadamente multicultural é recente em nível nacional e internacional. A gênese desta preocupação é motivada por distintas razões em termos: sociais, políticos, ideológicos e culturais, nos diferentes contextos onde está aflorando com maior intensidade, em especial na Europa, Estados Unidos e América Latina. Nesse cenário de transformações, a concepção da escola, suas funções e relações com a sociedade, o conhecimento e a construção de identidades pessoais, sociais e culturais se encontram em questionamento.

A educação tem a finalidade em si mesma, razão pela qual deve preocupar-se com as questões mais relevantes para a sociedade, como: a construção da cidadania, a leitura do mundo, a habilidade do pensamento e rigor da ciência, o desenvolvimento do senso estético, a construção do senso crítico e da utopia. Na busca para atingir esses objetivos o país necessita de contar com um sistema de ensino superior bem estruturado. As deficiências e fragilidades apontadas na literatura acadêmica e nas avaliações recentes do sistema superior brasileiro (Inep/MEC, 2006) mostram que o sistema de formação universitária não está conseguindo cumprir o seu papel da forma adequada.

Assim, o meio acadêmico brasileiro - em particular as universidades públicas federais -, vem sendo chamado a debater, nos últimos meses, o projeto Universidade Nova, que busca reestruturar a arquitetura acadêmica do ensino superior no país. Deve-se ressaltar que, essa discussão nos remete aos estudos seminais do educador Anísio Teixeira (2005), que há mais de 60 anos, tratou da importância da renovação educacional no país.

Trindade (2007), ao tratar da importância da contribuição de Anísio Teixeira no debate sobre a Universidade Nova, observa que a reforma universitária não é um processo acabado, mas um desafio permanente que deve ser entendido como uma transformação contínua. Nesse contexto coloca-se em discussão se o sistema brasileiro de educação superior encontra-se obsoleto. Uma parcela de autores que tratam desse tema vem alertando sobre a necessidade de fazer mudanças profundas nessa área. Nunes e Carvalho (2006, 2007), por exemplo, argumentam que “o conceito de ensino universitário e universidade” precisará ser revisto; Almeida Filho (2007), por sua vez, sustenta que o sistema além de obsoleto – visto que se desenvolveu sobre uma série de distorções - também é enviesado, não cumprindo as finalidades da formação universitária e perdendo sua capacidade de cumprir a formação profissional.

Entre as principais inovações do projeto Universidade Nova destaca-se a estrutura dos cursos. Nessa concepção os estudantes terão acesso à universidade por meio de uma formação universitária inicial e, na seqüência, irão realizar a formação em uma grande área de conhecimento – humanidades, ciências, saúde, etc. –, que deve durar três anos. Somente após essa fase, os estudantes poderão escolher uma formação profissional específica e complementarem o curso pretendido. Assim, haverá uma maior liberdade de escolha para os estudantes, que poderão definir de forma mais adequada a sua trajetória acadêmica. Essas mudanças também irão refletir-se no corpo docente das universidades, visto que exigirá uma renovação de práticas pedagógicas, e em última instância, nas próprias instituições, que passarão a ter mais autonomia e capacidade de auto-gestão.

Observa-se, por sua vez, que a ciência da educação sofreu nas últimas décadas uma significativa evolução, pressionada pelas rápidas mudanças em curso no mundo contemporâneo. Os avanços e transformações nos campos da economia, da cultura e da ciência, tecnologia e inovação impactaram fortemente na aprendizagem. O aprender e ensinar incorporou os novos conhecimentos produzidos nos campos da psicologia, biologia genética, inteligência artificial, nanotecnologia, entre outras. Feitas estas considerações, entendemos relevante incluir no debate da Universidade Nova o papel da educação a distância como ferramenta de suporte as políticas públicas de educação superior no Brasil.

No mundo contemporâneo o acesso à informação e à educação tornou-se uma necessidade premente, em que pese os dois universos ser distintos (Matias-Pereira, 2007). Na atualidade, é essencial para o sucesso dos indivíduos e das organizações saber trabalhar bem com as informações. O esforço para assimilar o imenso volume de informações que circulam por todos os meios fez com que estudar deixasse de ser uma fase na vida das pessoas para se tornar um processo continuado. Verifica-se que, a educação em nível de graduação e pós-graduação no Brasil, que era restrito a uma elite, está expandindo-se de maneira veloz para uma grande camada da população. Para esse imenso contingente de cidadãos a alternativa sãos os cursos de graduação, pós-graduação e outras opções que estão sendo oferecidas usando as ferramentas de EAD.

Diante desse cenário, fica evidenciada no debate sobre o projeto da Universidade Nova, a inclusão do tema: educação a distância, visto que a utilização da ferramenta educação a distância permite incluir, por meio da oferta de oportunidade de educação da qualidade, um grande número de pessoas que estão distantes de centros de formação, e que estão impossibilitadas de freqüentar os ambientes presenciais.

Torna-se possível, assim, sustentar que a reestruturação da arquitetura acadêmica do ensino superior – no contexto do projeto da Universidade Nova - passa pelo esforço da criação de uma nova cultura de educação a distância no meio acadêmico, diante da sua importância para o sucesso do novo modelo de políticas públicas de educação superior que está sendo construído no Brasil.

* José Matias-Pereira é doutor em ciência política (UCM/Espanha) e pós-doutor em administração (FEA/USP). Professor-pesquisador do Programa de Pós-Graduação em Administração da Universidade de Brasília. É diretor do Centro de Educação a Distância da Universidade de Brasília.