Universidade Nova não trará solução para os problemas acadêmicos

Projeto Universidade Nova: ciclo básico acirrará competição entre alunos e ampliará distância entre centros universitários "de excelência" e os de "segunda linha"

O projeto Universidade Nova tem sido tratado entre seus defensores como a solução para os problemas de acesso e permanência dos alunos nas instituições superiores de ensino (IES). Para Paulo Rizzo, presidente do ANDES-SN, o projeto é mais um capítulo da reforma universitária em curso cuja principal qualidade é maquiar as estatísticas do ensino superior no Brasil sem resolver seus principais problemas de forma permanente: mais financiamento público, autonomia universitária e maior acesso e condições de permanência dos alunos nas universidades.

Os principais méritos do Universidade Nova, propagados por seus entusiastas, são: fim da precocidade na escolha da carreira profissional, da seleção "pontual" e traumática para ingresso na graduação, da elitização da educação superior pública, e do distanciamento entre os cursos de graduação e pós-graduação, entre outros. Esses fins seriam atingidos com as alterações no modelo de ingresso nas IFES e com uma reestruturação da grade curricular, instituindo-se um bacharelado interdisciplinar.

O que ainda não está definido é a forma como os novos estudantes ingressarão nas universidades e como será feita a transição entre os níveis acadêmicos - bacharelado interdisciplinar (com duração de três anos), especialização, mestrado e doutorado. Com relação ao ingresso, cogita-se a possibilidade do Enem (Exame Nacional do Ensino Médio) substituir o vestibular.

Lighia B. Horodynski-Matsushigue, do GTPE (Grupo de Trabalho Política Educacional) e diretora do ANDES-SN na Regional São Paulo, avalia que o governo tem sentido a cobrança da sociedade por uma universidade capaz de atender às demandas de ingresso e por isso tem lançado mão de soluções simplistas que, no máximo, disfarçam os problemas reais maquiando as estatísticas.

A despeito de ainda não ter definidos os principais eixos, o projeto tem a simpatia e o apoio do Ministério da Educação (MEC). O reitor da Universidade Federal da Bahia (UFBA) e um dos defensores do projeto, Naomar Almeida Filho, argumenta que a universidade precisa estar em sintonia com as demandas do mercado de trabalho. Segundo ele, o projeto Universidade Nova não surge como uma alternativa à reforma universitária, mas "é a verdadeira reforma universitária para os que a propõem, pois a proposta do governo não atinge aspectos acadêmicos", argumenta.

Para Paulo Speller, presidente da Andifes (Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior), o Universidade Nova é um complemento à reforma proposta pelo governo. Um novo seminário para discussão do projeto deverá acontecer entre março e abril, na Universidade de Brasília (UnB). Em dezembro, foi realizado o 1º Seminário Nacional da Universidade Nova em Salvador, que reuniu representantes das IFES e o Ministéiro da Educação.

O problema do ciclo básico ou bacharelado interdisciplinar

Para Lighia, o problema central do Universidade Nova é que o governo quer ampliar o acesso ao ensino superior sem aumentar os investimentos sociais e na educação. "O problema não está no ciclo básico [bacharelado interdisciplinar], mas no fato de se propor a ser um ranking. Toda vez que o ciclo básico for utilizado como um ranking para a escolha da profissão, o estudante posto em frente a uma situação de pressão vai procurar se sair bem utilizando métodos ilícitos".

Além disso, Lighia argumenta que esse projeto não é novo. "O projeto da Academia Brasileira de Ciências (ABC) também propõe um ciclo básico, no qual você pode admitir o número muito maior de estudantes. Se o Universidade Nova for adotado haverá classes superlotadas", afirma a professora. Para ela, o processo de competição entre os alunos será bastante acirrado nos três anos do ciclo básico e algumas profissões acabarão ainda mais elitizadas. "Isso pode favorecer ainda mais o mercado privado, que continuará oferecendo os cursos completos para quem puder pagar", completa.

Lighia ainda prevê que a implantação do Universidade Nova acabará por ampliar a distância entre os centros universitários "de excelência" e os de "segunda linha". Isso se refletirá, inclusive, na atividade docente. "Nos ciclos básicos os professores darão mais aulas e terão menos tempo para pesquisas, acabarão atuando mais como monitores em disciplinas muito isoladas, em sua apresentação e avaliação, em função do critério de notas ", acredita.